quarta-feira, junho 13, 2012

Por que a televisão emburrece

Por Nelson José de Camargo*
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A televisão brasileira é constantemente louvada como uma das mais criativas e dinâmicas do mundo. As telenovelas, principais atrações da emissora líder de audiência, são exportadas para diversos países. É verdade que hoje, embora ainda dominem a audiência no horário nobre, não detêm mais praticamente o monopólio da audiência, em virtude do crescimento da TV a cabo e da internet. A grande massa, porém, permanece sintonizada na “dramaturgia global”.

Isso significa que essa dramaturgia é de boa qualidade, pois consegue prender a atenção de parte significativa da população? Não, muito pelo contrário. Trata-se, na verdade, da imposição de um modelo emburrecedor e que pasteuriza a cultura nacional.

“O Aufklärung intelectual é um meio infalível para tornar os homens inseguros, com a vontade fraca, com desejo de ser conquistados e protegidos, em resumo, transformados em criaturas de rebanho”, como disse Nietzsche. E é exatamente o conjunto das “criaturas de rebanho” que prestigia os folhetins televisivos. As telenovelas “globais” não passam de subliteratura barata, repletas dos mais batidos clichês, que apelam cada vez mais para os mais sórdidos instintos.

Assiste-se a um desfilar de tipos caricatos, representados por grandes “atores e atrizes”, fluentes no carioquês pasteurizado, independentemente da origem de seus personagens. Esse tipo de lixo influencia a moda, os costumes, os bordões, a música e a cultura do país, até ser substituído pela próximo telelixo do horário, escrito pelo literato de araque de plantão.

terça-feira, maio 29, 2012

Por que o jornalismo não é isento

Por Nelson José de Camargo*
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Em mais um dos escândalos de corrupção divulgados pela mídia, um jornalista de uma revista semanal de informação foi acusado de cumplicidade com um contraventor. Em resposta, um geógrafo de bastante prestígio na mídia acusou o chefe de redação de outra revista de divulgar acusações falsas contra um profissional idôneo para desviar a atenção da CPI e protelar, quem sabe indefinidamente, o julgamento dos acusados. Segundo o geógrafo, este chefe de redação teria escrito editoriais elogiosos ao regime militar, citando até mesmo a fonte de onde os obteve.

Aqui está um exemplo típico de conflito de interesses entre dois grupos políticos. Um deles tem ligações com o principal partido de oposição, e o outro faz parte, ainda que indiretamente, do grupo que dá sustentação ao atual governo.

Isso é um problema brasileiro? Definitivamente não. A história da imprensa é semelhante em todos os países onde existe (relativa) liberdade de expressão. Qualquer veículo de comunicação tem como tarefa primordial, ainda que escamoteada,defender os interesses de grupos que os sustentam.

domingo, abril 22, 2012

A corrupção na política: um problema brasileiro?

Por Nelson José de Camergo*
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A corrupção está sempre presente no noticiário político: escândalos, denúncias, CPIs, operações espalhafatosas da polícia federal, tudo isso alimenta diariamente o noticiário. Mas nenhum escândalo de corrupção fica muito tempo no noticiário: logo aparece mais uma notícia escabrosa que coloca o escândalo anterior no esquecimento.

É da natureza humana procurar acumular mais poder e riqueza, e para isso algumas pessoas são capazes de tudo. Os fins justificam os meios, numa frase atribuída a Maquiavel, mas que na verdade nunca foi dita por ele.

Alguns políticos brasileiros alavancaram sua carreira política no assim chamado “combate à corrupção”. Jânio Quadros, candidato a presidente em 1960, tinha como mote de campanha a “vassoura” que iria “varrer a corrupção”. Eleito, ficou apenas oito meses no cargo, e renunciou em circunstâncias até hoje não explicadas.

Com uma imagem de “defensor da moral e dos bons costumes”, Jânio quadros teve gestões bastante polêmicas nos cargos executivos que ocupou: prefeito de São Paulo, governador do estado e presidente. E não faltaram acusações de enriquecimento ilícito e desvio de dinheiro público.

Outro político brasileiro que se destacou com um discurso de “combate a corrupção foi Fernando Collor de Mello. Membro de uma tradicional família da oligarquia nordestina, Collor iniciou sua trajetória política no PDS – partido que dava sustentação ao regime militar. Depois foi eleito governador de Alagoas pelo PMDB. Tornou-se conhecido nacionalmente como o “caçador de marajás”, pelas medidas que adotou para combater privilégios de funcionários públicos.

sábado, março 24, 2012

Filosofia e literatura

Por Nelson José de Camargo*
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Filosofia e literatura têm diferenças e semelhanças. Ambas usam a linguagem para comunicar algo a alguém. Na Filosofia, o principal objetivo é expressar conceitos, ideias. Na literatura, existe a narrativa, isto é, o ato de contar uma história.

No entanto, a diferença entre uma obra literária e uma filosófica é mais sutil do que pode parecer à primeira vista. Os diálogos de Platão, por exemplo, poderiam muito bem ser enquadrados nas duas categorias – literatura e filosofia.

Ninguém dirá que Kant foi um literato – no sentido de que seu texto tem elegância e estilo dos grandes escritores – mas o que dizer de um Nietzsche? Poemas e aforismos, tão frequentemente empregados pelo autor do Zaratustra, são formas literárias.

Rousseau foi autor de um romance de sucesso na época: A bela Heloísa. Sartre tornou-se conhecido não apenas por sua filosofia, mas também pelos seus romances. E poucos escritores são tão filosóficos como Thomas Mann e Machado de Assis.

A Filosofia, como diz Wittgenstein, deve “tornar claros e delimitar precisamente os pensamentos, antes como que turvos e indistintos”[1]. Nem sempre a literatura é assim: basta ler autores obscuros como Joyce para comprovar.

domingo, março 18, 2012

Você e Deus


Por Ana Lucia Sorrentino*
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Quem começa a se interessar por filosofia logo percebe que Deus e o Amor são temas recorrentes nos textos filosóficos.Em “Amor” André Comte Sponville, filósofo francês da atualidade, afirma ser esse assunto o mais interessante de todos. Contra os que não concordam com essa ideia, Comte argumenta que, mesmo que não estejamos falando de amor, estamos sempre falando do amor que temos por algo ou por alguém.

Assim como o Amor, Deus parece ser, senão o assunto mais interessante, um assunto quase sempre inevitável para os filósofos. Se ele não for o tema central da reflexão, acabará sendo a causa ou solução para quase tudo que não se consegue compreender ou assimilar.

Muitas vezes a motivação primeira dos questionamentos filosóficos é um profundo sofrimento por conta de imposições religiosas baseadas em ideias fantasiosas sobre Deus. E não é raro que, na busca pelas suas verdades, o filósofo acabe se enroscando em suas próprias teorias e termine apelando para Deus. Não é muito difícil entender o porquê disso.

Deus é uma daquelas verdades que encontramos prontas quando chegamos ao mundo. Recebemos essa ideia já elaborada e ao longo de toda a nossa vida, tentaremos entendê-la e estabelecer com ela a melhor forma possível de relacionamento.

Mal aprendemos a pronunciar “mamãe” e já estamos às voltas com “Papai do céu”. Crescemos convivendo o tempo todo com expressões como “Vai com Deus, Deus é mais, Deus te acompanhe, Deus te ajude, Deus te Guie... Deus castiga. Deus sabe o que faz. Deus escreve certo por linhas tortas. Graças a Deus... Meu Deus!” – Como é que poderíamos conceber com facilidade a ideia de um mundo sem um criador?Com todo respeito, e pedindo aos filósofos de carteirinha que me perdoem, eu acho fantástico imaginar que Descartes tenha se torrado os miolos pra concluir que, se havia nele uma ideia de Deus, era porque o próprio Deus havia colocado essa ideia nele. Por acaso Descartes vivia em algum universo paralelo, isolado de tudo e de todos?