sexta-feira, abril 12, 2013

Por que sou contra a redução da maioridade penal

* Por Nelson José de Camargo
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Sempre que um crime brutal é cometido por um assim chamado “menor de idade”, reacende-se o debate sobre a redução da maioridade penal. Há projetos no Congresso para reduzir a maioridade penal para 16 anos. De modo geral, são propostas de políticos conservadores e adeptos de práticas clientelistas, ainda muito comuns no Brasil.

A adoção dessa medida seria absolutamente inócua para reduzir a violência, e apenas empurraria para o crime “menores de idade” ainda mais jovens, abaixo de 16 anos, por exemplo, que seriam os “novos menores”.

A solução para esse grave problema é muito mais radical. Começa pelo questionamento sobre o que é “maioridade”. O que é “maioridade penal”? Como definir alguém como “maior” ou “menor” de idade?

O primeiro registro formal de “maioridade” é oriundo do Direito Romano, que considerava “impúberes” homens com menos de 18 anos e mulheres com menos de 14 anos.

Na Idade média, boa parte dos conceitos do Direito Romano foi mantida. No período carolíngio, por exemplo, menores de 14 anos não podiam ser condenados à morte, ainda que estivessem sujeitos a receber castigos corporais.

Até o início do século XIX, era considerado “menor” no Brasil o indivíduo com menos de 20 anos, que não seriam submetidos às “penas totais” que poderiam ser aplicadas aos “maiores”.

No Império, a “maioridade penal absoluta” era atingida aos 14 anos, conforme o Código criminal então em vigor, inspirado na legislação francesa.

Com a proclamação da República, foram considerados inimputáveis os indivíduos até 9 anos. Pessoas entre 9 e 14 anos seriam submetidas a “análise de discernimento” para que fossem julgados os seus atos.

O código de menores, adotado em 1926, tornava inimputáveis os menores de 18 anos. Indivíduos entre 14 e 18 anos que cometessem crimes (ou, pela nomenclatura atual, “atos infracionais”), seriam abrigados em casa de “educação ou preservação”, ou “confiados à guarda de pessoa idônea” até completar 21 anos.

O Código Penal de 1940 estabeleceu definitivamente a inimputabilidade penal abaixo dos 18 anos, norma que foi mantida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA – de 1990.

Em outros países, ao limite de idade entre “maior” e menor” é variável: 14 anos (Itália), 13 anos (França), 14 anos (Japão), 14 anos (Noruega), 15 anos (Finlândia, 16 anos (Holanda), 16 anos (Portugal).

Como se vê, trata-se de um limite arbitrário. É possível distinguir de forma objetiva e científica quando uma pessoa passa a ser responsável pelos seus atos?

É evidente que não. Há pessoas com mais de 40 anos absolutamente irresponsáveis, e há pré-adolescentes de 12 anos sensatos. A mente humana é extremamente complexa e evolui de forma diferente em cada pessoa, conforme o contexto e a época. Logo, é perfeitamente possível que o pré-adolescente tenha plena consciência de seus atos, e que o homem de meia-idade não tenha.

Assim, a única conclusão racional é que o próprio conceito de “maioridade penal” é equivocado. Uma pessoa deve ser julgada de acordo com sua maturidade intelectual e conforme a gravidade do ato que praticou.

Logo, a modificação realmente efetiva para reduzir a violência praticada por e contra “menores” é simplesmente abolir o conceito de “maioridade”. Trata-se de elaborar uma legislação mais flexível, que leve em conta as infinitas variações existentes na espécie humana, e não que simplesmente aplique princípios estabelecidos pela tradição, pela moral, pela religião ou por qualquer ideologia. Ainda que isso signifique encarcerar um indivíduo de 10 anos e considerar inimputável um de 40. Ou seja, como defendia Aristóteles, “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade”.

* Nelson José de Camargo é graduado em jornalismo e filosofia








Um comentário:

Hailton Santos disse...

Realmente um texto consistente com bons argumentos. Concordo, Nelson... A redução da maioridade penal não implica redução da criminalidade. A questão é muito mais complexa e envolve outras instâncias. Todavia, no que tange à legislação, penso que cabe sim um debate no sentido de responsabilizar criminalmente o jovem infrator de 16 anos. Ora, se nessa idade o cidadão é apto a decidir o rumo da nação por intermédio do voto; se o jovem nessa faixa etária é capaz de conduzir veículo automotor... Por que não responder por suas infrações? Não dá para dissociar os princípios do DEVER de suas RESPONSABILIDADES.