Por Nelson José de Camargo*
Numerosas denúncias de corrupção têm sido veiculadas por parte da mídia, a maioria delas referente ao atual governo federal. “A corrupção no Brasil atingiu níveis alarmantes e inimagináveis”, é a constatação de alguns setores da sociedade. Não é difícil prever que as próximas campanhas eleitorais serão marcadas por um “combate a tudo o que aí está”.
Esse discurso não é novidade na política brasileira. Foi adotado pela oposição a Vargas nos anos 50; e foi o mote da campanha de Jânio Quadros em 1960, quando a “vassoura janista” iria varrer a “corrupção que grassava no país.”
Em tempos mais recentes, o discurso de combate aos privilégios de funcionários públicos que receberiam benesses do Estado, os assim chamados “marajás”, norteou a campanha de Fernando Collor de Mello, primeiro presidente eleito depois do período militar e que foi, ironicamente, apeado do poder em razão de denúncias de que comandada um grande esquema de corrupção.
Examinando a questão da maneira mais isenta possível e sem as paixões motivadas pela coloração partidária, constata-se que o poder em nosso país sempre foi controlado por uma elite agrária e, posteriormente, industrial e financeira, oriunda especialmente do Centro-Sul. Mesmo a subida ao poder de um indivíduo oriundo da chamada classe operária não mudou esse quadro, pois a coalizão política que sustentou (e sustenta o governo atual) inclui figuras que jamais se distanciaram do poder, como certos oligarcas, figuras ligadas a governos anteriores e políticos notoriamente fisiológicos.
Sendo assim, pode-se concluir que a corrupção é inerente ao sistema de presidencialismo de coalizão adotado no Brasil, no qual a governabilidade precisa ser “negociada”, ou comprada?
Sim e não. Afinal, não há partidos políticos verdadeiramente ideológicos nem parlamentares que representem realmente os interesses do povo. Quem se lembra em quem votou para deputado nas últimas eleições? A liberdade de escolher livremente seus representantes não constitui, verdadeiramente, um regime democrático. A constatação de Rousseau sobre o parlamentarismo inglês se aplica perfeitamente à democracia representativa brasileira: “O povo inglês pensa ser livre e engana-se. Não o é senão durante a eleição dos membros do Parlamento”.
Para que serve então a política? Apenas para perpetuar as mesmas elites corruptas no poder, em troca de umas poucas benesses distribuídas às classes menos favorecidas? A solução, pregam alguns, seria adotar um liberalismo radical, restringindo a presença do Estado a mero regulador as atividades sociais e econômicas. Afinal, as empresas estatais são meros “cabides de empregos” destinados a colocar os apaniguados do poder em “posições estratégicas”. Elimine-se, portanto, o Estado, para que a sociedade civil se auto-organize e autorregule, livre de interesses polítco-partidários.
Acontece que a história nos mostra que esse modelo foi um retumbante fracasso. Basta lembrar a crise de 1929, a crise financeira de 2008, ou a atual crise que ameaça até mesmo a mais poderosa potência econômica do planeta. Quando a especulação e o poder financeiro atuam sem limites, quando o Estado deixa de atuar em setores estratégicos da sociedade, o que temos é o caos, o desemprego, a violência, a exclusão social, a falência da educação, da ética e da sociedade.
E o que fazer com a massa de excluídos, ainda uma parcela importante da população de países em desenvolvimento como o Brasil? Condená-los a uma existência à margem da sociedade de consumo, privá-los da possibilidade de ascensão social, impedir que tenham acesso à cultura e à educação de qualidade?
“A democracia é o pior dos sistemas políticos, com exceção de todos os demais”, já dizia Churchill. E nenhuma sociedade é democrática se não der igualdade de oportunidade a todos os cidadãos; se não garantir saúde e educação públicas e gratuitas a todos; se não permitir livre manifestação de expressão e opinião. Tais garantias não podem ficar à mercê de interesses econômicos especulativos, mas devem ficar a cargo de um Estado que realmente promova a melhoria da qualidade de vida da população.
A política, portanto, tem importância fundamental para construir um mundo melhor. E é somente com a participação consciente e crítica de cada cidadão, o “animal político” aristotélico, que isso poderá ser possível em um futuro não tão distante.
*Nelson José de Camargo é Bacharel em Filosofia e Jornalista
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